No Bhagavad-gita, a primeira lição dada pela Suprema Personalidade de Deus, Krishna, é que não somos este corpo. A primeira instrução para a compreensão espiritual é saber que eu não sou meu corpo nem minha mente. Os yogis, no entanto, estão exercitando o corpo e estudando a psicologia da mente por meio de diagramas para tentar compreender a natureza do ser, mas Krishna diz que somos a alma e não o corpo. Portanto, não será através de exercícios para o corpo e para a mente que alcançaremos a perfeição espiritual. Se não sou este corpo nem a mente, como posso compreender minha alma pela simples prática de ginástica ou meditação? Este é o erro clássico dos karmis, jñanis e yogis.
Os carmis são os trabalhadores fruitivos, pessoas materialistas que buscam conforto e desfrute sensorial. Os jñanis são aqueles que, através da mente, tentam compreender a realidade extra-sensorial, pelo uso da lógica e da hermenêutica (arte de interpretar os livros sagrados e os textos antigos). E os yogis são aqueles que praticam exercícios físicos e mentais que estimulam o transe, a abertura dos chakras, o despertar da kundalini e manifestação de poderes místicos.
Não obstante o considerável esforço deles para alcançar a transcendência, todas estas atividades pertencem exclusivamente ao âmbito material e mundano, ou seja, são atividades que não poderão conduzir o praticante à transcendência, mesmo que sejam consideradas extremamente sutis. Atividades dessa natureza pouco podem contribuir para que o indivíduo compreenda sua verdadeira identidade transcendental enquanto alma, bem como a relação específica que cada alma mantém com Deus. Do contrário, quando dotado de poderes místicos ou paranormais, o indivíduo tende a se tornar orgulhoso, julgando-se ser o próprio Deus.
De acordo com o Bhagavad-gita, todos os seres vivos encarnados possuem um corpo sutil (mente, falso-ego e inteligência) e um grosseiro (terra, água, fogo, ar e éter), e executam quatro atividades básicas: comer, dormir, acasalar e se defender.
No entanto, após recebermos a raríssima oportunidade de nascer em um corpo humano, devemos aprender que aquilo que nos distingue das demais espécies é a capacidade de questionar sobre nossa própria existência e sobre como adorar a Deus. Religiosidade só existe entre os humanos, pois é somente através deste tipo de consciência que a alma pode manifestar a expressão máxima de sua natureza eterna como serva do Senhor. O sentido da vida não se resume a dar prazer para os nossos dois corpos, mas sim em utilizá-los no serviço do Senhor Supremo, visando apenas Sua satisfação plena.
Bhagavad-gita explica, portanto, que tentar conhecer Deus através da especulação mental, é comparado ao sapo que tenta calcular a dimensão do oceano Atlântico dentro de uma poça d’água. Não podemos compreender através dos sentidos materiais aquilo que é transcendental. Mas se empregarmos nossos sentidos no serviço do Senhor Supremo, poderemos purificá-los e sublimá-los, tornando-os capazes de interagir com Deus em um nível supramundano.
Mas não é por considerar que não somos este corpo, que devemos negligenciá-lo completamente. Às vezes, algumas pessoas deixam de cuidar da saúde física e acabam criando outros obstáculos à execução do próprio serviço devocional, decorrentes do surgimento de doenças e debilidades. Por este motivo é que no Bhagavad-gita, Krishna também nos instrui a como cuidar do corpo, de modo que possamos estar sempre aptos a executar nossas atividades devocionais. Embora não sejamos o corpo, será através dele que levaremos alimento à nossa alma. Quando bem utilizado, o corpo deixa de ser um obstáculo para o avanço espiritual e se torna um aliado fundamental neste processo.
No Bhagavad-gita 6.16-17, Krishna diz: “Aquele que come demais ou come muito pouco, dorme demais ou dorme muito pouco, não pode se tornar um yogi. Mas aquele que tem hábitos equilibrados para comer, dormir, recrear e trabalhar, pode mitigar todas as dores materiais pela prática do yoga”.
Krishna também ensina que na hora de comer devemos encher o estômago metade com alimentos, um quarto com água e manter um quarto vazio para o movimento do ar. Se o corpo não for devidamente mantido, ele cai e seca como uma árvore desenraizada, da qual flores e frutos não podem mais ser obtidos. O corpo e os sentidos são um veículo para a relação com o mundo e instrumentos criados por Deus que devem ser utilizados em Seu serviço. Se o corpo for utilizado como instrumento para o serviço de Deus, então deve ser valorizado como algo também divino.
Os Vedas descrevem que somos formados por quatro diferentes tipos de corpos: anna-maya kosha (alimentos), prana-maya kosha (ares vitais), jñana-maya kosha (conhecimento) e ananda-maya kosha (bem-aventurança). No entanto, todos esses quatro corpos estão relacionados com a esfera material. Alimentar nossos quatro corpos materiais é indispensável, mas devemos também alimentar nossa alma diariamente, através da prática de Bhakti-yoga, ou devoção a Deus. Este é o único alimento capaz de satisfazer plenamente a alma. Dentre todos os métodos de yoga, somente Bhakti é capaz de oferecer o que a alma necessita, ou seja, amor divino.